Alimentação inadequada, bebidas alcoólicas, sedentarismo e fumo contribuem para o aumento da incidência
Estimativas do Global Cancer Observatory (Globocan), elaboradas em 2020 pela International Agency for Research on Cancer (IARC), indicam que um em cada cinco indivíduos terá câncer durante a vida. O relatório sugere, ainda, que 1,9 milhão de casos novos de câncer de cólon e reto serão diagnosticados neste período, e aponta a neoplasia como o terceiro tumor mais incidente no mundo. As Estimativas 2023 – Incidência de Câncer no Brasil, do Instituto Nacional de Câncer (INCA), preveem 704 mil casos novos da doença (de todos os tipos) por ano no triênio 2023-2025 no País e estimam 45.630 novos casos de câncer de intestino a cada ano do triênio – com as mulheres liderando o índice, com previsão de 23.660 casos.
Caracterizada como uma doença que se desenvolve predominantemente a partir de mutações genéticas em lesões benignas, como pólipos adenomatosos e serrilhados, a probabilidade de óbito prematuro por causa do câncer colorretal entre pessoas de 30 a 69 anos pode ter um aumento de 10% até 2030, segundo o INCA. Outros tumores que acometem o sistema gastrointestinal são estômago (5ª posição), cavidade oral (8ª), esôfago (13ª), pâncreas (14ª) e fígado (15ª). No Brasil, o Sudeste concentra metade dos casos de câncer (geral). Sudeste, Centro-oeste e Sul, regiões com os maiores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), também têm maior incidência de câncer colorretal – que ocupa a segunda ou a terceira posição. No Nordeste e Norte, o câncer de estômago é o segundo ou o terceiro mais frequente.
Estudos apontam uma relação entre hábitos alimentares e estilo de vida, assim como exposições ambientais e ocupacionais – especialmente nas grandes cidades – como fatores de maior risco da população para o desenvolvimento dessas neoplasias malignas. O risco de desenvolvimento de câncer gastrointestinal também está associado ao comportamento moderno, pautado por sedentarismo, obesidade, consumo regular de álcool e tabaco e baixo consumo de fibras, frutas, vegetais e carnes magras. “No Brasil e no Ocidente, de forma geral, o câncer colorretal é o mais comum dentre os possíveis no sistema gastrointestinal e tem relação com a nova dieta que é repleta de comidas industrializadas, fast food e embutidos. Quanto mais gordura, maior o risco. Já os asiáticos são mais acometidos pelo câncer gástrico porque consomem alimentos muito salgados”, sinaliza a médica gastroenterologista e oncologista Nora Manoukian Forones, coordenadora do setor de Oncologia Gastrointestinal da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) e presidente da Associação Brasileira de Câncer Gástrico (ABCG).
Outros fatores de risco estão associados ao comportamento moderno que alterou a forma de mobilidade e recreação humana, e elevou a exposição a poluentes ambientais. O médico oncologista Tiago Felismino, líder do Centro de Referência de Tumores do Aparelho Digestivo Alto do A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo, lembra que os índices são resultado de um fenômeno que vem acontecendo desde o fim do século 20. “As doenças que mais matavam a população, como as infecciosas e cardiovasculares, vêm sendo mais controladas, tornando o câncer uma causa cada vez mais comum de óbitos. É preciso destacar que o perfil dos pacientes acometidos por algumas neoplasias também está mudando e, atualmente, há um aumento na incidência em pessoas mais jovens, principalmente com câncer de intestino”, indica. Esse quadro, inicialmente descrito nos Estados Unidos, já é realidade no Brasil – onde indivíduos com idade entre 40 e 50 anos estão sendo cada vez mais diagnosticados.
O médico pontua que há um avanço nas pesquisas que buscam colaborar para diminuir a incidência deste tipo de neoplasia, como os estudos que correlacionam obesidade, consumo exagerado de carnes vermelhas e deficiência de vitamina D e o câncer do intestino. “Há indícios de que o déficit desta vitamina pode até colaborar com maior agressividade depois da doença diagnosticada. Pode ser que, no futuro breve, seja recomendada reposição de vitamina D não apenas para proteção óssea, mas também como fator protetor contra o câncer intestinal”, acredita. Outra substância estudada é a aspirina, um medicamento barato e seguro que poderia diminuir as chances da neoplasia, mas ainda não está definida como medida de saúde pública e não pode ser utilizada sem prescrição médica. Outro fator de risco pode ser o microbioma intestinal. Pesquisadores da Wayne State University School of Medicine, nos Estados Unidos, sugerem que o microbioma equilibrado é a chave para reduzir o risco de desenvolver a doença. Um estudo realizado na China também mostra que há uma diferença significativa nas comunidades bacterianas fecais entre pessoas saudáveis e pacientes em quatro estágios de tumores colorretais.