Microbiota e os resultados comportamentais em crianças

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Microbiota intestinal e comportamento infantil

Escrito por: Fernanda Ortiz

A microbiota intestinal é reconhecida em inúmeros trabalhos científicos como um regulador do desenvolvimento cerebral e dos resultados comportamentais durante a infância. No entanto, a fusão desses dois fatores é frequentemente inconsistente, pois as relações hospedeiro-microrganismos variam amplamente entre os indivíduos. Em busca de respostas, recentemente o estudo ‘Cluster-specific associations between the gut microbiota and behavioral outcomes in preschool-aged childrencines’  identificou novas associações entre a microbiota intestinal (clusters), seus metabólitos e resultados comportamentais em crianças em idade pré-escolar com desenvolvimento típico.

Para o estudo, foram selecionados participantes do ensaio canadense Alberta Pregnancy Outcomes and Nutrition (APrON), um estudo de coorte longitudinal em andamento que, inicialmente, recrutou mulheres com menos de 27 semanas de gestação. De acordo com os pesquisadores, a partir da seleção foram coletadas amostras de fezes de 248 crianças com desenvolvimento típico, com idade entre 3 e 5 anos. “A microbiota intestinal foi analisada usando sequenciamento do gene 16S (que permite a identificação genética de diversas espécies de bactérias), enquanto a Cromatografia líquida-espectrometria de massa (LC-MS/MS) foi usada para metabolômica não direcionada”, explicam os autores.

Paralelamente, os pais preencheram um Questionário de Frequência Alimentar (QFA) semiquantitativo, que lista os alimentos normalmente consumidos por crianças em idade pré-escolar, quais alimentos e com que frequência eram consumidos pelas crianças. Além disso, incluíram outros alimentos que faziam parte da dieta, mas não constavam na lista. O QFA foi usado para gerar um índice de qualidade da dieta (DQI) previamente validado, no qual valores mais altos indicam maior adesão à recomendação do Guia Alimentar do Canadá, de 2007.

Os resultados comportamentais em crianças relatados pelos pais – ou seja, habilidades adaptativas, internalização, externalização, sintomas comportamentais e transtornos sociais do desenvolvimento – foram analisados usando o Sistema de Avaliação de Comportamento para Crianças (BASC-2). “Os subcomponentes de Habilidades Adaptativas foram posteriormente comparados entre os clusters. As diferenças estatísticas foram avaliadas por meio de testes de Kruskal-Wallis seguidos de testes de Mann-Whitney”, relatam os autores. A partir desse levantamento, as crianças foram agrupadas com base na composição da microbiota intestinal usando o método multinomial de Dirichlet para, na sequência, serem investigadas diferenças no metaboloma e nos resultados comportamentais.

Resultados

Com base nas análises, os autores identificaram grupos distintos de microrganismos na microbiota intestinal. O grupo enriquecido em Bacteroides e Bifidobacterium (Ba2) apresentou metaboloma das fezes mais distinto. Já o cluster (agrupamento) caracterizado pela alta abundância de Bifidobacterium (Bif), assim como o cluster Ba2, foram associados a menores escores de Habilidades Adaptativas e de seu subcomponente Habilidades Sociais.

O cluster Ba2 também apresentou rotatividade significativamente menor de histidina (aminoácido essencial) nas fezes para urocanato, sendo associado a pontuações mais baixas em Habilidades Sociais de maneira dependente do cluster. Finalmente, o cluster Ba2 apresentou níveis aumentados de compostos envolvidos no metabolismo da galactose (monossacarídeo obtido pela alimentação mediante o consumo de leite e derivados), no qual a alfa-D-glicose foi associada às pontuações da vida diária do subcomponente Adaptativo Habilidade, de maneira dependente do cluster.

De acordo com os autores, os resultados fornecem novos insights sobre os efeitos condicionais do microbioma intestinal no metabolismo microbiano e nos resultados comportamentais das crianças em idade pré-escolar com desenvolvimento típico. Dessa forma, corrobora o conceito de que agrupamentos baseados em clusters poderiam ser usados ​​para desenvolver intervenções mais personalizadas para sustentar os resultados comportamentais das crianças. O artigo ‘Cluster-specific associations between the gut microbiota and behavioral outcomes in preschool-aged childrencines’ foi publicado em março de 2024 no periódico Microbiome.

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