As infecções persistentes com genótipos de alto risco do Papilomavírus humano (HR-HPV) constituem um importante fator de risco para a neoplasia intraepitelial cervical, que são lesões precursoras do câncer de colo do útero. Este microambiente cervical é composto por células imunes e microbiota diversificada. No microambiente do colo do útero e vaginal, o gênero Lactobacillus parece ter um fator fundamental, pois exerce uma influência significativa na estabilização e na interrupção do microbioma do trato reprodutivo.
De acordo com pesquisadores da Polônia, os Lactobacillus spp. desempenham uma série de funções importantes na homeostase do microambiente do colo do útero e vaginal, como efeitos anti-inflamatórios que melhoram a função de barreira. “As espécies de Lactobacillus produzem ácido láctico, que acidifica o microambiente local a um pH <4,5, protegendo contra o desenvolvimento de inflamação”, explicam. Além disso, os metabólitos produzidos por Lactobacillus spp. estimulam a produção de peptídeos antimicrobianos e citocinas anti-inflamatórias.
Para avaliar esse papel do Lactobacillus exercendo influência significativa tanto na estabilização quanto na perturbação do microbioma do trato reprodutivo, os pesquisadores realizaram um estudo clínico. O foco era analisar a distinção entre a microbiota do colo do útero e o status dominante e não dominante de Lactobacillus em casos de HPV de alto risco e mulheres saudáveis não infectadas.
Para isso, foram analisadas 69 amostras de 44 mulheres com diagnóstico de infecção por HR-HPV e 25 saudáveis (controle) com teste negativo para HPV e exames de Papanicolau normais. “Os resultados alcançados com o estudo forneceram informações sobre a associação entre a microbiota cervical, infecções por HPV de alto risco e status não dominante de Lactobacillus”, informam os autores.
Achados
Os cientistas identificaram uma abundância significativamente menor de Lactobacillus mucosae em mulheres com infecção por HR-HPV em comparação com o grupo controle. Além disso, foram observadas alterações na diversidade bacteriana em amostras de Lactobacillus não dominante (LND) em comparação com Lactobacillus dominante (LD) em ambos os grupos. “Mostramos pela primeira vez que apenas L. mucosae exibiu abundância significativamente menor no grupo de mulheres com infecção por HPV de alto risco em comparação com as voluntárias do grupo de controle”, enfatizam os autores.
Além disso, amostras de LND em mulheres infectadas por HR-HPV exibiram um estado disbiótico cervical caracterizado por deficiência de Lactobacillus. Por sua vez, o grupo LD HR-HPV mostrou uma super-representação de Lactobacillus helveticus. “Em resumo, o estudo destacou os papéis distintos de L. mucosae e L. helveticus nas infecções por HR-HPV, sinalizando a necessidade de mais pesquisas para demonstrar possíveis implicações clínicas da disbiose da microbiota cervical”, detalham. O estudo ‘Cervical microbiota dysbiosis associated with high-risk Human Papillomavirus infection’ foi publicado em 2024 na revista científica Plos One
Diferenças
Com uma grande diversidade de microrganismos, o trato genital de mulheres saudáveis contém principalmente uma ou várias espécies de bacilos de ácido láctico. Em contraste com a microbiota intestinal, caracterizada por uma grande diversidade de microrganismos, o trato genital de mulheres saudáveis contém principalmente Lactobacillus crispatus, L. gasseri, L. iners, L. jensenii e L. acidophilus.
Já a vaginose bacteriana está associada à eliminação de Lactobacillus spp., que são substituídos por uma mistura diversificada de bactérias anaeróbicas como Anaerococcus, Atopobium, Dialister, Fusobacterium, Gardnerella, Gemella, Prevotella, Megasphaera, Parvimonas, Peptoniphilus e Peptostreptococcus.