Carrapato transmissor da febre maculosa

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Carrapato transmissor da febre maculosa

Escrito por: Fernanda Ortiz

Os produtos naturais extraídos de plantas, ervas, animais, microrganismos, artrópodes e parasitas têm sido uma fonte confiável de moléculas bioativas para a descoberta farmacêutica. Um estudo de revisão realizado no Instituto Butantan, em São Paulo, mostrou que a glândula salivar do carrapato-estrela (Amblyomma sculptum), transmissor da febre maculosa, possui moléculas com potencial para tratar doenças. A partir do DNA da glândula, os cientistas produziram uma proteína recombinante com atividade antitumoral, nomeada Amblyomin-X, que pode ser utilizada no desenvolvimento de fármacos.

Os carrapatos são animais hematófagos (se alimentam de sangue), que possuem diversas moléculas com atividade inibitória de serina proteinases ou complexos do sistema de coagulação. Além disso, as moléculas  são vasodilatadores e inibidores de agregação plaquetária. “Essas moléculas ajudam os animais sugadores de sangue a superarem o mecanismo de defesa do hospedeiro para continuar se alimentando”, observam os autores. Amplamente estudado por ser o transmissor da febre maculosa, o carrapato-estrela foi escolhido para os estudos por possuir na sua saliva inúmeras moléculas ativas que participam de vários processos fisiológicos, como é o caso da Amblyomin-X.

Apesar de ter sua origem no carrapato que transmite o patógeno da febre maculosa, a proteína Amblyomin-X foi desenvolvida em laboratório na forma recombinante, a partir da sequência de DNA extraída da glândula salivar do animal. Dessa forma, não transmite a doença. “A molécula Amblyomin-X é descrita como um inibidor do tipo Kunitz, que impede a ação de proteases (enzimas que degradam outras proteínas). Neste caso, é capaz de inibir a atividade do proteassoma das células, que desempenha papel central na homeostase proteica por regular diversos processos celulares”, descrevem os autores. Além disso, a substância é capaz de ativar a resposta imunológica. Entretanto, novos testes são necessários para descobrir como a proteína pode modular tal resposta.

Ação antitumoral 

A atividade citotóxica da proteína recombinante com ação antitumoral Amblyomin-X em células tumorais e sua capacidade de reduzir o crescimento tumoral e a metástase em modelos in vivo levou à vasta exploração de suas funções, mecanismos de ação, estruturas, farmacocinética e biodistribuição. “Em testes preliminares com animais, a Amblyomin-X induziu morte de diferentes células tumorais, especialmente as derivadas de tumores sólidos, e parece desempenhar um papel no microambiente tumoral ativando o sistema imunológico contra a progressão do tumor e de metástase”, comentam os autores.

Testes de segurança indicaram que esta proteína recombinante, além da resposta satisfatória, não apresenta toxicidade. Portanto, não afeta células, tecidos e órgãos não tumorigênicos, tornando-a uma molécula atraente para terapia anticâncer, na qual o desafio é suprimir o crescimento tumoral e diminuir os efeitos colaterais do tratamento. Considerando os esforços atuais para desenvolver terapias anticancerígenas eficazes, a proteína se destaca, portanto, como uma candidata promissora a medicamento antitumoral.

Coordenado pela pesquisadora Ana Marisa Chudzinski-Tavassi, diretora do Centro de Desenvolvimento e Inovação (CDI) do Butantan e coordenadora do Centro de Excelência para Descoberta de Novos Alvos Moleculares (CENTD), até o momento a proteína recombinante inteira mostrou capacidade de combater tumores em animais. Atualmente, a partir da produção de diferentes peptídeos sintéticos, os cientistas buscam estabelecer formulações que mantenham as moléculas estáveis para diversas aplicações. O artigo ‘A Kunitz-type inhibitor from tick salivary glands: A promising novel antitumor drug candidate, que apresenta uma revisão de 20 anos de pesquisa, foi publicado em 2022 na revista Frontiers in Molecular Biosciences.

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