As opções de tratamento para transtorno bipolar e sintomas de ansiedade concomitantes são limitadas. Isso porque a eficácia dos medicamentos de primeira linha aprovados para transtornos de ansiedade não pode ser generalizada para o manejo da ansiedade no transtorno bipolar. Entretanto, a cariprazina, um antipsicótico atípico usado no tratamento da esquizofrenia, poderia ajudar a reduzir episódios maníacos e depressivos do transtorno bipolar. Essa foi a conclusão do estudo ‘Efficacy of cariprazine in patients with bipolar depression and higher or lower levels of baseline anxiety: a pooled post hoc analysis’, desenvolvido por pesquisadores canadenses e norte-americanos.
As comorbidades psiquiátricas, especialmente os sintomas de depressão e ansiedade basal clinicamente significativos, são muito comuns em pacientes com transtorno bipolar. “Quando os sintomas são concomitantes, os pacientes apresentam mais episódios depressivos e maníacos/hipomaníacos, períodos curtos de eutimia e menor tempo para recaída”, relatam os autores. Além disso, têm maior comportamento suicida, aumento de problemas de abuso de substâncias, risco ampliado de sintomas residuais e redução na qualidade de vida.
De acordo com os cientistas, tratar sintomas do transtorno bipolar em conjunto com os de alta ansiedade basal é uma abordagem clínica necessária para pacientes com esta apresentação desafiadora da doença. Com o objetivo de avaliar a eficácia da cariprazina, que atua principalmente como agonista parcial dos receptores D₂ e D₃ de dopamina, os pesquisadores realizaram análises post hoc, ou seja, testes estatísticos para identificar diferenças significativas entre as médias de grupos. “Os dados para análise foram agrupados de dois estudos de fase 3, randomizados, multicêntricos, duplo-cegos e controlados por placebo em adultos com transtorno bipolar I e um episódio depressivo maior”, detalham. Cada estudo teve um período de triagem (até 14 dias) seguido por um tratamento duplo-cego de seis semanas, além de um período de acompanhamento de segurança de uma semana.
Promissores
Os pacientes foram randomizados para receber placebo, cariprazina 1,5mg/dia ou cariprazina 3mg/dia. “A cariprazina 1,5 e 3mg/d foi avaliada em subgrupos de pacientes com maior e menor ansiedade basal”, relatam os autores. Em pacientes com ansiedade inicial mais alta, diferenças significativas para 1,5mg/d de cariprazina versus placebo foram observadas na mudança na pontuação total na Escala de Avaliação de Montgomery-Åsberg (MADRS), na pontuação total da Escala de Avaliação de Ansiedade de Hamilton (HAM-A), nas pontuações das subescalas e nas taxas de remissão MADRS. Além disso, melhorias numéricas não significativas foram observadas para cariprazina 3mg/d versus placebo.
Em pacientes com menor ansiedade, as diferenças em relação ao placebo foram significativas para alterações na pontuação total do HAM-A (cariprazina 3mg/d) e MADRS (cariprazina 1,5 e 3mg/d). “As taxas de mania emergente do tratamento foram baixas e semelhantes para a cariprazina e o placebo”, descrevem no estudo. A cariprazina 1,5mg/d teve efeitos consistentes nos sintomas de ansiedade e depressão em pacientes com depressão bipolar I e ansiedade basal mais elevada. Inclusive, a tolerabilidade foi favorável. De acordo com os pesquisadores, diante dos poucos tratamentos comprovados para esta comorbilidade comum, estes resultados preliminares são promissores.
Limitações
As limitações destas análises incluem a sua natureza post hoc e a falta de ajuste para comparações múltiplas. Os estudos constituintes não foram concebidos ou desenvolvidos para avaliar a eficácia da cariprazina simplesmente nos sintomas de ansiedade, mas sim concomitante ao transtorno bipolar. “Durante as análises, os pacientes foram autorizados a continuar usando doses estáveis de benzodiazepínicos, o que talvez possa ter afetado os resultados de ansiedade. Para compreender melhor desfechos inconsistentes da cariprazina 1,5mg e 3mg/dia em subgrupos com maior e menor ansiedade basal, estudos futuros podem ser necessários”, sugerem os autores.
Os cientistas ressaltam que, neste estudo, nenhum agente farmacológico foi aprovado especificamente para tratar sintomas de ansiedade em pacientes com transtorno bipolar, sendo essa uma necessidade desafiadora e urgente não atendida. A falta de um agente aprovado para transtorno bipolar e sintomas de ansiedade também pode precipitar o aumento do uso de polifarmácia, associando implicações clínicas e de custos elevados para casos de difícil resposta. “Dada a elevada prevalência de ansiedade na perturbação bipolar e o seu impacto negativo nos resultados relacionados com a doença. Embora os resultados que mostram que a cariprazina 1,5 mg/dia teve benefícios consistentes nos sintomas de ansiedade e depressão sejam promissores, ainda são preliminares”, finalizam os autores. O artigo ‘Efficacy of cariprazine in patients with bipolar depression and higher or lower levels of baseline anxiety: a pooled post hoc analysis’ foi publicado em março de 2024 no periódico International Clinical Psychopharmacology.